Prefácio
O primeiro capítulo deste livro é um resumo de todo ele. O que se segue é apenas o desenvolvimento do tema central, que é o seguinte: “Não queirais levar sozinho o vosso fardo”.
Para certas obras, há a vantagem de se ler de uma só vez, ou ler partes substanciais por vez. Esta é de uma natureza diferente. Se tem alguma utilidade, por pouco que seja, será maior se se ler um breve capítulo de cada vez, e nunca mais de um por dia.
Alguns dos nossos breves ensaios destinam-se simplesmente a fazer as vezes do percutor que liberta a força explosiva do pensamento pessoal. Toda a eficácia que talvez resulte das considerações expostas aqui dependerá da aplicação que cada um de nós possa fazer delas às suas próprias necessidades e problemas. Se uma leitura de cinco minutos não provoca uma meditação de cerca de um quarto de hora, o livro terá falhado o seu fim, neste caso individual pelo menos.
Consciente dos seus próprios limites, o autor apresenta aos seus irmãos no sacerdócio estas reflexões sobre o ideal, com uma reserva legítima, os fins e as dificuldades que temos em comum. Na sua caridade, aqueles que tiverem ultrapassado de longe os limites em que o livro se confina, talvez rezem com muito maior fervor por nós que ficamos aqui atrás.
Um pouco de distensão
Dizer ao sacerdote que repouse? O conceito pode parecer estranho. Todos os livros de espiritualidade que lemos nos convidam constantemente a redobrar de esforços, a visar mais alto e a nunca estarmos satisfeitos conosco, tais como somos. Todos eles, sem exceção, têm razão, como se vê. Limitam-se a tecer considerações sobre a missão de que Jesus Cristo encarrega todos os cristãos: “Sede perfeitos, como também vosso Pai Celestial é perfeito” (Mt 5, 48).
Eles, os autores espirituais e os pregadores de retiros, que estimulam as nossas aspirações lânguidas, cumprem o seu dever. A exortação contínua poderia desencorajar-nos se não tivéssemos como contrapeso a palavra de São Paulo que nos lembra a variedade das graças. “Há, pois, diversidade de graças... os ministérios são diversos... e as operações são diversas, mas todas estas coisas são operadas por um só e mesmo Espírito, repartindo a cada um como quer” (1Cor 12, 4-11).
Ninguém sabe quantas tragédias sacerdotais há todos os anos. Manifestam-se pela bebida, pelo abandono do dever, pela depressão mental. Menos ainda se conhece o número das defecções parciais que se podem verificar. É o caso daqueles que se agarram desesperadamente ao seu cargo, embora achem que o sacerdócio lhes deixa um sabor amargo e que se veem frustrados na sua recompensa.
Sem dúvida, há alguns sacerdotes indignos ou desgraçados cuja condição é, afinal, o resultado da sua própria negligência, deliberada, a respeito da graça de Deus. No entanto, quer-nos parecer que entre estes tristes destroços há muitos cujo estado se deve mais à falta de discernimento do que à falta de boa vontade. O educador diria que são homens que fixaram um nível demasiado elevado às suas aspirações. Mas não, não é que eles tenham querido ver alto demais, porque Jesus Cristo é o ideal de cada um de nós. Sentiram-se, talvez, consternados com a distância que havia entre Ele e eles, e depuseram as armas sem terem feito nenhum esforço efetivo; ou então foram depressa demais na sua alta ambição e precipitaram-se na queda que não se fez esperar.
Conviria talvez deixar de falar “deles” e falar antes de “nós”. Não é lícito supor razoavelmente que a maior parte de nós sofremos, numa certa medida, desse demônio do meio-dia que é o desencorajamento e o desespero nascente? É possível que em alguns os assaltos se produzam de uma maneira dramática, mas é raro. Em outros, a tendência para a prostração será mais ou menos crônica e exprimirá um aspecto latente, mas presente na vida cotidiana. O matiz será tão discreto que assumirá a forma de um vago descontentamento, de ansiedade ou de insegurança.