Nota do autor
Todos nós vivemos de modo muito parecido. Acordamos, tomamos café, saímos para o trabalho, almoçamos, trabalho de novo, voltamos para casa enfrentando o trânsito, jantamos, fazemos alguma coisinha, dormimos. E no outro dia é tudo de novo. Se você é estudante, troque “trabalho” por “escola/faculdade”; se você é desempregado, acrescente “procurar” antes de “trabalho”; e por aí vai. A história segue, as coisas acontecem, mas estamos ocupados vivendo nosso cotidiano, nossos dramas pessoais, nossas lutas e vitórias. E assim os grandes acontecimentos históricos passam e mal os percebemos.
Personagens não-bíblicos e suas histórias nasceu desse pressuposto. Assim como nós vivemos o dia a dia sem fazer parte dos episódios históricos ao nosso redor, também havia muitas pessoas nos tempos do Novo Testamento que, embora vivessem numa época em que o Deus Filho se fez carne e falou a muitos, também não estavam a par das últimas novidades – ou talvez até estivessem! Mas, quem tem tempo para essas coisas, né? Este livro fala de personagens como eu e você. Gente que trabalha, sonha, espera, confia em Deus, passa por dificuldades, enfrenta terríveis provações, que ora e espera por uma resposta – que, muitas vezes, não era nada daquilo que imaginava.
Há alguns pilares que regem o livro. Primeiro, a ideia é trabalhar personagens “não-bíblicos”. Portanto, todo este livro é uma obra de ficção. Há fatos, registrados na Bíblia ou na História, que são citados, mas os personagens e seus dramas são criações de uma mente um pouco desvairada. Além disso, alguns principais personagens bíblicos podem aparecer uma vez ou outra, mas quero tratar de histórias que aconteciam ao redor deles.
Segundo, as histórias buscam se desenrolar da maneira verossímil em relação ao tempo e às Escrituras, mas sempre de uma maneira ficcional. O leitor identificará costumes, lugares e outros detalhes próprios à época, sempre numa linguagem que permita se relacionar com a narrativa. Além disso, alguém familiarizado com a Bíblia identificará referências escondidas nas histórias.
Um parêntese aqui: ainda que verossímeis, o leitor verá que não estou propondo contos historicamente acurados necessariamente. Digo isto porque você verá um linguajar e algumas expressões que, certamente, não estão relacionados com o povo ou com a cultura daquela época. Mas tudo bem! O que importa aqui não é fazer um relato da época: há livros próprios para isso. O que eu quero é contar as histórias de um modo que você, o leitor, veja de perto o drama daqueles personagens.
Terceiro, os contos tratam do cotidiano, não de coisas grandiosas demais. O propósito maior é mostrar que Deus está no nosso dia a dia, e não só em momentos especiais – da mesma forma como acontece com os personagens. Por certo que alguns grandes eventos são citados, mas o que importa não é o evento em si, mas como as pessoas daquela época reagiriam a ele ou como isso impactaria suas vidas.
Tudo isto começou em 2016, quando, pela providência divina (e ela somente), fui premiado num concurso literário – que me inscrevi por acaso. Desde então busco aperfeiçoar esta habilidade e usá-la a serviço do Reino. São histórias simples, de um escritor simples, para leitores simples, falando sobre a simplicidade da vida.
Este livro é escrito para todos os leitores. Se você não é cristão e isto chegou às suas mãos, espero que você também possa se relacionar com as histórias, viver e conhecer o drama de alguns personagens. Se, por acaso, não entender alguma referência bíblica, não se preocupe: a Bíblia preencherá todas as lacunas que venham a surgir. Depois dê uma olhada lá. Se ainda assim não for suficiente, procure um amigo cristão e ele terá prazer em lhe explicar. Mas, acima de tudo, divirta-se com estes personagens não-bíblicos e suas histórias.
Seja Deus nosso guia e nossa luz,
S.D.G.
Uma noite no campo
Jeriel saiu de casa contrariado naquela noite. Não havia serviço pior do que cuidar das ovelhas nesse horário. Ibsão e Samuel, seus irmãos, o acompanhavam animados e conversavam:
– Que nada, eu mato uma raposa só com uma pedra!
– Hunf! Olha quem está se achando o rei Davi! Você não acerta nem uma pomba parada.
– Você nem sabe!
– Pois eu que sei. Eu com uma espada mato um leão, tô te dizendo.
Jeriel usava toda sua paciência para seguir o passo, apoiando seu cajado no chão. Os dois irmãos mais novos precisavam aprender o serviço logo. O pai já estava em idade avançada, e ele, em vias de se casar, não sabia como iam ser as coisas. Melhor botar essa meninada para aprender o serviço direito.
A diferença de idade era boa: Jeriel com seus 26 anos, Ibsão com 15 e Samuel com 13. Mas Jeriel sentia o peso da primogenitura nas costas, sabia de seus deveres como irmão mais velho e futuro líder daquela casa. Olhou para o céu. De novo aquela estrela ali. Os irmãos mais novos pulando à frente, em direção ao campo, e Jeriel pensando:
“Faz um tempo que essa estrela tá aí. O que pode significar? Um sinal divino? Um símbolo? Ou só uma estrela qualquer? Se, pelo menos, tivéssemos um profeta pra consultar… Ah, mas também será que haveria intérprete que dissesse com certeza o que há na Lei? Há tantas interpretações, tantas mishnás a serem estudadas. Como posso saber se…” Seus pensamentos foram interrompidos pela fala de Samuel que, virando-se para trás, disse:
– Olha, Jeriel! A estrela de novo! – o irmão mais velho fez um aceno com a cabeça:
– Estou vendo.
– Você sabe o que ela significa? – perguntou Ibsão.
– Confesso que não tenho a menor ideia.
(...)