Prefácio
O ser humano naturalmente é um ser que se interroga sobre diversas questões. Qual o sentido da vida? O que é a morte? Quem sou eu? Tem sentido ter fé em Deus? Há liberdade? O que é o relativismo?
O homem não se realiza apenas em existir. Ele sente uma necessidade profunda de conhecer a verdade sobre as coisas e si mesmo. Apesar de toda a sua fragilidade e limitações, ele coloca o mundo, a vida e os fatos como objetos a serem compreendidos e perscrutados.
Ademais, no Brasil, a grande maioria das pessoas se dizem cristãs e muitos são os questionamentos apresentados sobre a cosmovisão cristã da realidade.
Em minha trajetória como professor e pregador, sempre fui questionado por várias pessoas sobre diversos temas existenciais e também aspectos do pensamento cristão. Por exemplo: quem é Deus? O que é a Santíssima Trindade? O que significa a virgindade de Maria? Como conciliar fé e razão? O que é a felicidade? Etc.
Os cristãos sempre foram desafiados a explicar o fundamento de sua fé e a causa de sua esperança. No mundo contemporâneo não é diferente. Muitas vezes o cristianismo é acusado de incoerência e superficialidade. Somente uma pessoa não esclarecida poderia aderir a uma fé tão confusa e questionável, segundo os arautos de um novo ateísmo.
Na presente obra, tenho por objetivo oferecer ao leitor a oportunidade de pensar sobre determinados temas e também apresentar alguns esclarecimentos sobre diversas questões tanto de cunho filosófico, quanto religioso.
Em cada tema, apresento uma breve reflexão, e no final indico algum texto para aqueles que quiserem continuar se aprofundando e analisando o problema apresentado.
Espero que esse livro ajude a você, caro leitor, na sua busca pelo conhecimento verdadeiro.
Como diria Santo Agostinho: “Mas porque é que a verdade gera o ódio, e se tornou inimigo para os homens aquele que prega a verdade – apesar de eles amarem a vida feliz, que não é senão a alegria que vem da verdade – a não ser porque a verdade é amada de tal modo que todos aqueles que amam outra coisa querem que seja verdade aquilo que amam e, porque não queriam ser enganados, não querem ser convencidos de que estão enganados? E assim odeiam a verdade por causa daquilo que amam em vez da verdade. Amam-na quando resplandece, odeiam-na quando censura” (Confissões X, 23, 34).
São Paulo, Epifania do Senhor de 2016.
Dr. Joel Gracioso
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O que amamos quando amamos?
Em suas Confissões IV, 13, 20 Santo Agostinho nos diz que interpelava os amigos dizendo: “Acaso alguma coisa amamos a não ser o belo? Mas que é o belo? E que é a beleza? Que é que nos atrai e nos une às coisas que amamos?”.
Vemos, neste trecho, como para o Santo Doutor há uma íntima relação entre o belo e o amor. Parece que o belo é justamente aquilo que seduz e desperta no homem uma atração amorosa. Há uma certa tendência natural do ser humano em relação ao belo. Quando de fato amamos algo, parece ser justamente à beleza presente na coisa aquilo que amamos.
Deus é o princípio de toda medida (modus), de toda forma (species) e de toda ordem (ordo), presentes em todas as criaturas, tornando-as, assim, coisas boas e belas. Qualquer que seja a criatura analisada, corporal ou espiritual, Deus lhe concedeu a medida, a forma e a ordem. De acordo com o grau desses atributos, a criatura que os possui será um grande ou um pequeno bem. Onde encontramos essas três coisas em grau elevado temos grandes bens; onde em grau inferior, temos pequenos bens e onde em grau zero não há bem algum.
O grau de medida, forma e ordem, determina o nível de perfeição das criaturas e o local de cada uma na hierarquia presente no mundo.
Deus, por outro lado, é somente unidade; cria a ordem, mas não é a ordem e também não tem medida, pois é a Suprema Medida. Se as coisas possuem uma unidade é porque participam da suprema Unidade que é Deus.
Assim, para Santo Agostinho há uma beleza presente em cada criatura particular, pois tudo o que é, é uno.
Como também do ponto de vista da totalidade do cosmos, pois há uma unidade na própria estrutura e organização do cosmos. Desta maneira, a beleza das criaturas é um reflexo da beleza do Criador.
Portanto, algo simétrico, isto é, algo que tenha igualdade entre as partes, é belo porque é harmonioso, e isso implica também a unidade. Logo, na perspectiva de Agostinho, pode-se afirmar que o que torna algo simétrico ou não simétrico belo é a unidade ou a harmonia que conduz a ela.
Esse modo de abordar a problemática do belo, principalmente em uma época em que tudo é relativo e meramente subjetivo, nos leva a pensar que talvez algo seja belo não porque eu o amo. Não é o meu amor que torna algo belo. Mas é porque algo já é belo em si mesmo que desperta em mim o amor, a atração por ele.
Assim, o ser humano quando ama parece estar em busca da suprema Beleza, fonte de toda unidade e harmonia presentes no mundo. Porém, nem sempre tem a devida humildade para reconhecer isso.
Para aprofundar:
FORTE, Bruno. A porta da beleza: por uma estética teológica. Aparecida: Ideias e letras, 2015.
SANTO AGOSTINHO. A verdadeira religião. São Paulo: Paulus, 2007.