Padre Afonso Rodrigues (também conhecido como Alonso Rodríguez) nasceu em Valladolid, em 1538, e faleceu em Sevilha, em 1616.
Recebeu o título de bacharel em Artes em Valladolid e, aos dezoito anos, mudou-se para Salamanca para estudar teologia. Lá entrou em contato com a Companhia de Jesus, onde foi admitido aos vinte anos.
Após completar os estudos de teologia, passou a ensinar Moral em Monterrey e Valladolid. Apenas sete anos após ser recebido na Companhia, foi feito mestre de noviços, cargo que exerceu por doze anos. Foi também reitor durante dezessete anos, e diretor espiritual em Córdova durante onze anos.
Em Córdova, concluiu a obra monumental Exercícios de Perfeição e Virtudes Cristãs, publicada em 1609. Faleceu em Sevilha, aos 78 anos.
A quem lhe pedia que escrevesse para certo mosteiro de monges alguns avisos e conselhos espirituais, responde, escusando-se, na Carta 27 do livro 6.º do registro, o bem-aventurado S. Gregório: “Os religiosos, que pela graça da compunção e oração têm em si a fonte da sabedoria, não precisam ser orvalhados com as minguadas correntes da nossa secura. Como no Paraíso terreal não houve chuva, nem era necessária, porque uma fonte que do meio dele saía o regava copiosamente, conservando-o verdejante, fresco e aprazível, assim o religioso que está no Paraíso da Religião, e que alimenta em si a fonte da oração e compunção, não tem necessidade de ser por nós orvalhado, porque ela basta para conservar sempre em sua alma o frescor e formosura das virtudes”.
Com maior razão me pus eu a desculpar-me com Vossas Reverências a quem o Senhor fez o favor de plantar neste paraíso da Companhia de Jesus, e fecundar com a oração mental, que temos cada dia em conformidade com as nossas Regras e Instituto, a qual S. João Crisóstomo, num tratado que fez da oração, compara à fonte levantada em meio de um jardim, que o conserva sempre exuberante e vistoso. Mas isto aconteceria se eu pensasse em dizer coisas que Vossas Reverências não soubessem nem praticassem todos os dias.
Porém, nesta obra, não tenho em vista mais que refrescar, e trazer à memória o que todos muito bem sabem e exercitam, em conformidade com o que nosso Padre
[1] nos diz nas Constituições. Para isto há alguém que semanalmente, ou ao menos de quinze em quinze dias, em práticas espirituais e exortações públicas, nos exponha estas e outras coisas semelhantes, para que, pela condição da nossa frágil natureza, não nos fujam da memória, e assim, cesse a execução delas, costume que pela bondade do Senhor se exercita e pratica na Companhia, com não pequeno fruto dos que nela vivem.
E porque, ainda que com muita confusão minha, me exercitei neste ofício, por ordem da obediência, mais de quarenta anos, com os noviços e com os antigos, juntando e recolhendo muitas coisas referentes a isto, pareceu a meus Superiores e a muitas outras pessoas, a quem devo respeito, que serviria a Deus Nosso Senhor e à Companhia, limando e ordenando estes trabalhos, para que assim, o fruto possa ser mais universal, durável e perpétuo. Nesta obra, imito o seráfico Doutor S. Boaventura, que procedeu do mesmo modo, como ele mesmo diz no prólogo dos seus livros
De profectu Religiosorum.
Também adverti que nas ditas Constituições acrescenta nosso Padre:
Vel illi haec legere teneantur. Há quem destas coisas se lembre, ou sejam obrigados a lê-las. Muito contribuiu para começar este trabalho, saber que também nós temos de regra, na Companhia, o exercício tão proveitoso e recomendado pelos santos de fazer todos os dias leitura espiritual, para nosso proveito. A isto ordeno principalmente este livro, pondo diante dos olhos com a possível clareza, as coisas mais substanciais, práticas e ordinárias, em que, segundo a nossa profissão e Instituto, devemos exercitar, para que nos sirvam de espelho, em que cada dia nos vejamos, fugindo do mau e imperfeito que condena, e adornando as nossas almas com o bem e perfeito que aconselha, para que assim agrademos mais à Divina Majestade.
E ainda que nisto o meu principal intento seja servir a meus Padres e Irmãos em Cristo caríssimos, a quem por muitos títulos tenho particular obrigação, contudo, como a caridade se deve se estender o quanto puder, o que é muito próprio do nosso Instituto, procurei dispor esta obra de forma que não só fosse proveitosa para nós e para os demais religiosos, mas também para todos os que tratam de virtude e perfeição.
Assim corresponde a obra ao título genérico “
Exercícios de perfeição e virtudes cristãs”. Chamam-se “Exercícios” porque se tratam as coisas muito praticamente, para que assim melhor se possam pôr em execução. Dividem-se em três partes, contendo cada uma oito tratados. As citações põem-se em latim, porque para os que o entendem poderá ser muito proveitoso pela força e eficácia que têm as coisas tomadas na sua fonte, principalmente sendo esta a Sagrada Escritura. Para os que não entendem latim, não será impedimento porque se põem também em vernáculo; e para que nada os embarace, e o possam mais facilmente omitir, vai o latim com letra diferente.
[2]
Espero no Senhor que não será em vão o nosso trabalho, mas que esta semente da palavra de Deus, lançada em tão boa terra, como é a dos corações desejosos de alcançar a perfeição, há de produzir fruto não só de trinta, mas de sessenta e até de cem por um.
Pe. Afonso Rodrigues