Uma palavra do autor
A primeira vez que li algo sobre a celebração da Santa Missa com o antigo Missal foi em 2004. Eu já tinha visto algumas imagens nos antigos Missais dos fiéis, fui acólito por muitos anos, sabia rezar algumas orações em latim, mas tomar contato com a “Missa antiga” foi como “amor à primeira vista”. Anotei o endereço onde ela era celebrada — na capela de Santa Luzia, que fica na Rua Tabatinguera, centro de São Paulo — e lá fui eu. A sensação foi fantástica. Voltei no domingo seguinte e adquiri um Missal dos fiéis. A partir daí, acredito que todos os meus amigos mais próximos, de uma forma ou outra, acabaram conhecendo comigo a Santa Missa celebrada segundo o antigo Missal.
Eu não era um jovem diferente de outros. Tinha 19 anos, fazia faculdade, trabalhava, frequentava a Missa aos domingos e exercia alguma atividade pastoral. Mas ali houve um encanto. Eu já amava a Santa Missa paroquial e, por isso, desenvolvi o gosto por estudar a liturgia. Sabia — mais por experiência do que por estudo — da necessidade da obediência às normas litúrgicas e da recepção bem feita do Santíssimo Sacramento. Quando descobri a Missa celebrada com o antigo Missal (que chamávamos de “Missa antiga”, “Missa em latim” ou “Missa tridentina”) foi como a concretização de tudo o que eu já havia vivenciado. E lá ia eu, de vez em quando, na “Missa antiga” com meus amigos; no fim, íamos a alguma padaria ou na tradicional feira da Liberdade.
Participar da “Missa antiga” não era um motivo de discórdia para mim. Eu não conseguia sentir diferença na celebração da Santa Missa entre a sua forma antiga e a nova. Com certeza havia uma atmosfera diferente — sem falar do canto gregoriano, que era inebriante —, mas não havia contradição. Tanto na minha paróquia como na pequena capela de Santa Luzia eu me exercitava na fé católica — a única fé, da única Igreja fundada por Nosso Senhor.
Em 2005, o cardeal Ratzinger foi eleito papa, assumindo o nome de Bento XVI. Desde o começo de 2007 havia rumores do lançamento de um documento que regulamentaria a celebração da Santa Missa com o antigo Missal. A data foi marcada para o dia 07 de julho daquele ano, um sábado. Nesse dia, acordei cedo, imprimi o Motu Proprio e, entre uma aula e outra que eu ministrava, o li. Era magnífico. Na época, houve uma explosão de opiniões, positivas e negativas. As antigas listas de discussão por e-mail e os grupos do Orkut tinham dezenas, centenas de mensagens.
Porém, independentemente da opinião que os outros expressavam, eu sempre soube, eu sempre senti, aquilo que o papa Bento XVI disse na carta aos bispos que acompanhava o Motu Proprio: “o que era sagrado para as gerações anteriores continua sagrado hoje” e, igualmente, “o documento busca a paz no seio da Igreja”. A hermenêutica da ruptura, tão combatida pelo papa Bento XVI, não pode “dessacralizar” ou “proibir” algo que, por séculos, foi considerado santo. O Motu Proprio tem esta finalidade: não apenas dar o direito aos fiéis que se sentem ligados à Forma Extraordinária de terem suas necessidades espirituais sanadas, mas também dar um lugar de destaque, e ao mesmo tempo de igualdade com a Forma Ordinária, para um Rito tão venerável — que alguns autores piedosos remontam a São Pedro, enquanto outros colocam sua codificação em São Gregório Magno. A tarefa de escrever sobre a Santa Missa na Forma Extraordinária não é fácil, mas é gratificante. Cada pequena rubrica, cada decreto emitido pela Santa Sé, cada comentário de um grande liturgista, era um bálsamo de amor a Nosso Senhor Jesus Cristo Eucarístico, ao “Augusto Sacramento” — como diversas vezes ele é chamado ao longo das obras pesquisadas.
Aqui cabe diferenciar o trabalho de pesquisa desta obra daquele dos dois primeiros volumes1. Grande parte dos documentos está compilada e analisada nos manuais de liturgia; logo, para além das rubricas contidas nos livros litúrgicos, a busca pelos melhores manuais foi essencial para o desenvolvimento desta obra. Autores como Wapelhorst, padre Réus, padre Coelho, padre Fortescue foram fundamentais na pesquisa, mesmo porque, houve sempre uma unidade entre eles. Ressalto que, comparado ao volume sobre a Forma Ordinária do Rito Romano, a parte sacerdotal da Santa Missa é descrita com uma necessária minúcia muito maior. As rubricas acabam por pedir isso.
O objetivo deste livro é levar a Santa Missa na Forma Extraordinária para a maior quantidade de pessoas possível; assim, desde o sacerdote até o acólito, todos podem encontrar aqui a parte do ritual que lhe cabe. As únicas funções que não entraram aqui são aquelas solenes (a Missa com diácono e subdiácono) e as as pontificais. Deus queira que o livro permita que aquelas ocorram; mas já seria muito bom conseguir que a Missa lida ou a Missa cantada do sacerdote fosse celebrada e mais difundida pelo Brasil.
Como o Motu Proprio, também este livro deseja levar a paz. As sugestões para a celebração da Santa Missa na Forma Extraordinária visam ornar as celebrações já existentes na Forma Ordinária com outras na Forma Antiga. A ideia central é a cura de almas. Nem mais, nem menos. Se este livro conseguir auxiliar no pastoreio das almas, principalmente dos jovens, que buscam a atmosfera da Forma Extraordinária, já me darei por satisfeito. Sempre tive em mente as palavras de Nosso Senhor: Ut omnes unum sint (Jo 17,21), que todos sejam um.
Também desta vez sou obrigado a agradecer textualmente algumas pessoas, porque sei que sem elas a obra não seria publicada ou escrita em tempo relâmpago, como o foi. Agradeço a meu editor, Luiz Eduardo, que sugeriu a mudança da ordem de publicação dos volumes da série; aos amigos André Delair, músico e professor, e Paulo Morais, músico português, que auxiliaram na parte musical desta obra. Agradeço ao servo de Deus padre Réus, que intercedeu a Deus e permitiu que Eduardo Rocha, um devoto seu, ilustrador católico, se interessasse pela obra e a ilustrasse, baseando-se nas imagens contidas na clássica obra do “Curso de Liturgia” e o fizesse da melhor e mais educativa maneira possível. Agradeço ao Antonio Carlos Mazuchelle, que gentilmente leu a obra e opinou sobre ela. Por fim, mas não menos importante, agradeço minha noiva, Jéssica Reketis, que me auxiliou especialmente com os textos em latim e a organização da obra, tornando possível, com esse esforço conjunto, apresentar o livro aos senhores. Por fim, neste dia de São Miguel, grão-mestre da Milícia de Santa Maria, entrego o livro a ele, mas, também e especialmente, a Santa Maria, Nossa Senhora. Ela que, como Mulher Eucarística, primeiro sacrário da humanidade, saberá tornar este pequeno e imperfeito instrumento em algo digno. Cada dia mais tenho a certeza de que: Não faço o bem que quero, mas o mal que não quero (Rm 7,19). Por isso, confio a Nossa Senhora esta obra. Nossa Mãe saberá fazer dela o melhor.
Michel Pagiossi Silva
Cavaleiro e preceptor da Militia Sanctae Mariae no Brasil,
Presidente da Academia Internacional de Estudos Litúrgicos
“São Gregório Magno”