Apresentação
Este livro reproduz um sermão pregado pelo Pe. William Frederick Faber (1814 - 1863) – sacerdote da Congregação do Oratório de São Filipe Neri, convertido da Igreja Anglicana – no dia primeiro de Janeiro 1860, na Igreja do Oratório de Londres, por ocasião da exposição solene do Santíssimo Sacramento pelo Santo Padre, o Papa Pio IX.
Este sermão expõe com grande profundidade os motivos que todos os cristãos têm de venerar o Papa, não somente como sendo o Pai comum dos fiéis, mas principalmente como sendo o representante visível de Jesus Cristo na terra.
Nele, o autor nos relembra as formas que Nosso Senhor se utilizou para permanecer conosco, aqui na terra: primeiramente, e da forma mais sublime e real de todas, através do Santíssimo Sacramento; depois, visivelmente, através dos idosos e das crianças; e por último, da maneira mais paternal de todas, deixando-nos seu Vigário: o Santo Padre, o Papa.
Assim, o ilustre e piedoso oratoriano, ao mostrar-nos como essa devoção é parte essencial da piedade cristã, quer suscitar em cada um dos fiéis da Igreja não apenas respeito e amor filial ao Santo Padre, mas sim uma?verdadeira devoção.
A vida de Jesus é modelo para a vida do cristão
O ano novo começa com uma festa de Jesus, e essa festa lembra a primeira efusão do Seu sangue. É isso como uma espécie de tipo da vida cristã inteira. Cristo vive em nós, e nós, por nossa vez, vivemos da vida d’Ele.
A vida do homem redimido está, por assim dizer, de tal forma entrelaçada à graça e à ação do Redentor, que não podemos concebê-la como separada d’Ele. Ele está como que misturado a tudo o que fazemos, a tudo o que somos, a tudo o que sofremos. Não temos uma só alegria, uma só mágoa que não seja tanto d’Ele como nossa: são d’Ele porque são nossas.
Ele é o fim, a força e a energia de toda vida santa. Faz de toda coisa a Sua coisa própria, mesmo da que menos parece pertencer aos Seus interesses. A Sua jurisdição estende-se ao mesmo tempo a todo o conjunto e às menores minúcias: faz parte do Seu amor o fazer dos nossos menores interesses os Seus interesses maiores.
O velho ano termina com o Seu Nascimento, como que para dissipar a tristeza que inspira o tempo decorrido por essa lembrança tão doce da eternidade. O novo ano começa com uma de Suas dores; como que para reconduzir à razão as alegrias inconsideradas, e para temperar a impetuosidade da ação.
O dizer que Jesus está em toda parte e em todas as coisas é definir com verdade a nossa vida. À medida que envelhecemos, Ele nos atrai mais, e absorve a nossa vida com mais força e de maneira mais exclusiva. Do mesmo modo que Ele foi desde toda a eternidade o pensamento principal de Deus, assim também o Seu pensamento deve dominar em nós todos os outros.
Nós só vivemos para adorá-lO. Fomos predestinados, porque Ele mesmo o foi primeiro. Ele é o primogênito de toda criatura; nós fomos feitos à Sua imagem e para Ele. Temos, cada um, alguma obra especial a fazer para Ele, algum ofício especial a desempenhar na Sua corte, alguma vocação especial que deve proporcionar-Lhe uma glória particular.
Tal é o sentido da nossa vida. Nada somos sem Ele; mas somos-Lhe ao mesmo tempo caros e preciosos. Ele faz de nós grandes coisas, e fazermo-lO tudo em todas as coisas para nós é sabedoria e felicidade nossa.
Não somente é verdade que Jesus é nossa vida, mas é também verdade que a Sua vida é a nossa vida, e isso é real sob uma multidão de aspectos, desde a augusta realidade do SS. Sacramento, até às influências que cada um dos mistérios de Nosso Senhor exerce sobre as nossas orações e sobre o nosso caráter.
Em toda a criação de Deus, depois do mundo dos anjos, não há nada mais maravilhoso do que uma vida humana. Tem havido milhões dessas vidas que tiveram cada uma a sua maravilha própria e particular; haverá milhões e bilhões dessas diversas criações. Mas há uma vida que é a verdadeira dentre todas, uma vida mais maravilhosa do que o pode ser uma vida angélica: é a vida de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, Deus e homem conjuntamente.
Ele viveu trinta e três anos na terra; a Sua vida foi uma cadeia ininterrupta de mistérios. Os Seus méritos infinitos e as Suas infinitas satisfações são os tesouros que enriquecem a pobreza do mundo. Foi a Sua vida humana que supriu os nossos meios de expiação, ao mesmo tempo que, pelos Seus exemplos, fornecem o modelo de toda santidade humana. Nossas vidas devem ser modeladas pela vida d’Ele.
O amor de Jesus, a semelhança com Jesus, eis as coisas que formam a santidade completa. Toda a história real do mundo, tudo o que verdadeira e propriamente nos concerne, encontra-se reunido nos quatro Evangelhos e nas reminiscências dos trinta e três anos.
Mas essa é apenas uma parte da verdade: a vida de Nosso Senhor não é só um exemplo exterior, é um poder, uma graça, uma eficácia cuja energia imortal se transmite até às idades mais remotas, quer nas operações dos sacramentos, quer nas graças da contemplação. Com outras palavras: os trinta e três anos não passaram; nunca passarão; continuar-se-ão na Igreja até o fim dos tempos.