Acompanhamento espiritual: um cenário, dois atores, um diretor
Toda apresentação teatral tem necessidade de um cenário, atores e diretor. Pode ser mais ou menos feliz o recurso a esta imagem, mas certamente na tarefa do acompanhamento espiritual aparecem estes elementos.
Por cenário, não me refiro ao espaço em que se deve realizar o específico acompanhamento espiritual, necessariamente mais concreto, mas ao contexto social geral e pessoal em que nos encontramos ao habitar a cidade moderna. Só poderemos chegar com êxito ao término de nossa missão se compreendemos bem o ponto de partida.
A grande maioria de homens e mulheres deste século são homens e mulheres cansados. Este é o cenário. Com frequência, o ponto de partida é o esgotamento. Nossas conversas de cada dia, e mesmo as de caráter mais transcendente e elevado, veem-se com demasiada frequência atravessadas pelo desânimo. Quando nos perguntamos como estamos, a resposta encalha muitas vezes nos arrecifes do esgotamento. É um contínuo não posso mais. Saturação? Obesidade por atividade, excesso de tarefas.
Por outra parte, o ambiente dominante é a aparência. Os amigos nas redes sociais se contam às centenas ou milhares, porque propriamente já não compartilham nada de essencial: apenas uma imagem mais ou menos verdadeira. É possível ter cem mil (um milhão!) amigos; irão desaparecer tão logo decaia o sucesso profissional ou o musculoso bíceps fora de proporção.
Aparência de família feliz, de homem poderoso, de mulher perfeita... E, ao contrário: frustração por ter uma família com dificuldades, homem limitado, mulher desajeitada. Haverá, porém, alguém que consiga o impossível equilíbrio em todas e cada uma de suas coisas? A questão não está em como chegar ao êxito, mas em saber ser feliz na limitação ou mesmo no fracasso. Aceitar de bom grado os próprios limites e manter a paz num coração que luta por aquilo que é verdadeiramente importante.
No contínuo desenrolar de tais circunstâncias, não é estranho que a única opção seja simples e naturalmente fugir. Aos atores, cabe a fuga. O panorama de opções para a disparada é quase infinito: desde umas férias como parênteses, uma aquisição consoladora (carro ou casa nova) ou um projeto profissional inovador, até o universo inteiro das falsas religiões ou da superstição; para não falar de outras condutas que imaginam ser descanso... e são complicações.
Muitas vezes, o início do acompanhamento espiritual acontece não tanto para buscar alguém que me leve à santidade, como pelo prazer de ter falado com alguém que me oriente na adversidade. Sob este ponto de vista, dá muita paz o ser acompanhado por alguém com experiência, que está certo em seus critérios e é sensato em suas reflexões. É natural que homens e mulheres modernos, tão plenamente envolvidos nas ocupações normais e nas dificuldades de costume, encontrem um atrativo em serem escutados em suas decepções e lutas, desânimos e esperanças.
Não são poucos os que voltam à fé católica quando descobrem a beleza de se saberem acompanhados. Este não-caminhar-sozinho se expressa de muitas maneiras. Uma pregação simples e concreta é suficiente para sentir-se conduzido. Um fim de semana com outras famílias ou um grupo de casais também é um excelente instrumento.
Esta nova geração de cristãos sente-se contente quando descobre que o sacerdote – ou a pessoa escolhida – escuta pacientemente os próprios problemas e os ilumina a partir de uma perspectiva de fé. Causa alegria escutar uma palavra de ânimo e conselho.
Entretanto, é comum que ninguém lhes tenha explicado como se dirigir a quem os acompanha espiritualmente. Por essa razão, e em muitas ocasiões, o acompanhamento espiritual pode chegar a ter reduzidas repercussões concretas. Permanece restrito à estreita margem do diálogo momentâneo e consolador. Esta é precisamente uma das tarefas deste livro (e de toda a vida): conseguir que o acompanhamento espiritual não seja apenas um lenitivo puramente psicológico ou afetivo, no nível do coaching ou de qualquer outro apoio pessoal ou psicológico. A terapia e o acompanhamento espiritual são distintos entre si em suas finalidades, como se verá mais adiante.
Agora, o importante é ter em conta que o atrativo do acompanhamento como descanso da alma é somente o primeiro passo no caminho de sua realização. O último passo será a santidade, a causa pela qual as pessoas podem aproximar-se – se o desejam – deste meio soberano que tão adequadamente conduz a tal fim. Em nenhum caso, portanto, são sujeitos suscetíveis de acompanhamento espiritual apenas os feridos pela vida ou os chamados a tomarem determinadas decisões. O acompanhamento espiritual se emparelha com a santidade, e ambos são uma tarefa oferecida a todo filho de Deus.
Com o passar dos anos, floresce outro perigo no acompanhamento espiritual. Se o novato deve estar precavido para dar profundidade à sua conversa, o experiente estará advertido do perigo de ter perdido a fé em que este instrumento possa ajudar de verdade. Com efeito, o veterano recorre pontualmente à direção espiritual por alguma razão (talvez porque é bem visto na comunidade cristã que ele frequenta: paróquia, lugar de formação, movimento), mas faz muito tempo que deixou de lado a intenção de levá-la verdadeiramente a sério. Pressionado pela eficiência, comparece apressadamente à conversa fraterna, sem preparação alguma e com reduzido desejo de emenda. A sensação é algo parecido com “basta que tenha achado tempo para vir vê-lo”. Ele cumpre. Mas tenho sérias dúvidas de que tal cumprimento seja positivo para a alma.
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Se o acompanhamento espiritual é uma “representação”, a esta é dado um cenário (capítulo primeiro) e dois atores: o acompanhado (capítulo segundo) e o acompanhante (capítulo terceiro). Descreve-se, portanto, a situação do homem atual e seu ambiente, assim como as características que seria desejável encontrar naquele que vai ser depositário do íntimo de sua consciência.
Tudo isto, entretanto, seria inútil se não considerássemos o papel do diretor da representação. Falamos sobre Aquele que conhece pormenorizadamente a nossa vida, tolera os defeitos e ornamenta a alma com as bondades de sua graça, de extraordinária beleza. Falamos de quem é Pai e Irmão dos atores, Mestre Interior desses corações que procuram escapar da ansiedade e participar já do repouso reservado aos santos. Em definitivo, falamos de Deus: o único diretor da belíssima obra da santificação (capítulo quarto).