Quando nos dedicamos a refletir sobre Maria, a mãe de Jesus, precisamos nos deter primeiramente sobre os dados revelados e depois, em segundo plano e não menos importante, sobre os efeitos da revelação na história. E a partir da leitura sobre o dado revelado e dos efeitos históricos, conseguimos perceber a importância do estudo da Mariologia, uma vez que não estudamos a figura de Maria isoladamente, mas sim, em consonância com o mistério de Cristo.
Tendo em vista esse princípio metodológico, percebemos que o estudo e a compreensão da figura de Maria nos possibilita uma interpretação mais apurada da manifestação de Deus no tempo histórico. Pois, estudar a figura de Maria, não supervalorizar a sua imagem em detrimento à imagem de Cristo, é reconhecer a grandiosidade da obra de Deus realizada no meio dos homens e principalmente na vida dessa mulher, que foi a escolhida para trazer o filho de Deus ao mundo.
Tudo em Maria é um reconhecimento da onipotência de Deus que realiza grandes coisas nela (Lc 1,49), da Sua onipresente Graça que já habita naquela que o Arcanjo Gabriel saúda: “Alegra-te, cheia de Graça! O Senhor está contigo”
[1], e da Sua onisciência que prevê a desobediência dos primeiros pais (Adão e Eva), mas reconduz a história pelo “Sim” de Maria. Por isso, dedicamo-nos a aprofundarmos na compreensão de Maria.
Negar a importância desse estudo é negar também a importância da manifestação de Cristo na história, é negar a importância da Encarnação do Verbo Divino, Jesus Cristo, o Filho do Deus vivo. O mistério do Filho de Deus só pode ser compreendido a partir de uma visão universal e temporal, à medida em que contemplamos a história universal da salvação e em sua plenitude com a Encarnação do Verbo. Percebemos a revelação de Deus, que desde a criação inclina todas as coisas a uma realização e plenitude. Com o pecado dos primeiros pais, vê-se que a humanidade adquire uma desordem e, no decorrer do tempo, Deus, pela sua infinita bondade, busca reconduzir a história, até que, “quando se completou o tempo previsto, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que eram sujeitos à Lei, e todos recebemos a dignidade de filhos”
[2]. Assim, para compreender o mistério de Cristo, o Filho de Deus que se fez homem, é preciso perceber toda a pedagogia divina e sua manifestação histórica, que prepara a humanidade para a vinda do Messias e que faz com que essa mesma humanidade perceba a sua presença no Verbo Encarnado, prefigurado pelos antepassados e anunciado pelos profetas. Portanto, negar as manifestações de Deus em Maria é negar a própria manifestação de Cristo no tempo e na história.
Maria é uma figura essencial na História da Salvação da humanidade, pois é a escolhida para dar à luz ao Filho de Deus, Jesus (Deus Salva). Aqui o que nos importa não é o que Maria fez, mas o que Deus realizou nela. Precisamos ter uma grande prudência para não confundir afetos com aquilo que é a sã doutrina, de forma que também a nossa devoção seja realmente saudável, sem roubar de Deus as glórias e méritos devidos, e nem de Maria a veneração e o respeito que lhe cabem, por ter sido para nós a Mãe do Nosso Senhor Jesus Cristo.
Poderia ter sido outra mulher? Poderia ter sido em outro tempo? Poderia ter sido de outra forma? Essas perguntas muitas vezes roubam a cena e acabam desviando do foco que deve ser contemplado. Não nos cabe questionar a obra divina, cabe-nos tentar entender o projeto de salvação de Deus para a humanidade. Mas, é certo que se fosse outra mulher, nós a veneraríamos e respeitaríamos da mesma forma, por ser a mãe de Deus. Se fosse em outro tempo, esses dados chegariam da mesma forma até o nosso estudo. Se fosse de outra forma, Deus o revelaria a nós. Mas, o que nos importa é o dado revelado e seus efeitos na história até os dias de hoje.
Portanto, se fizermos a pergunta: “por que estudar Mariologia?”, poderíamos responder com toda certeza que seria para compreender mais profundamente o mistério da Salvação em Cristo Jesus. O fim último do estudo de Mariologia é o próprio Deus.
1 – Importância Antropológica
A Mariologia tem seu lugar na antropologia, pois Maria, que foi preservada do pecado original, manifesta a plenitude da vida da Graça. E dessa forma “
Maria é o modelo da pessoa humana na Graça, bem como tipo da Igreja”
[3]. Maria é a perfeita Imagem e Semelhança de Deus, a ‘
cópia fiel’. Assim, como ao criar o homem, Deus disse: “
Façamos o homem à nossa Imagem e à nossa Semelhança”
[4], Maria é criada também nessa mesma condição. Com isso, Maria não foi tocada pela culpa dos primeiros pais, permanece em estado de plenitude. E assim, como a graça tem o poder de
redimir do pecado, Deus quis pela graça
preservar Maria, e a fez
Toda Santa (
Panagia).
Maria é a perfeita expressão da plena condição humana criacional. Maria conserva em si aquilo que é a essência do desejo de Deus para a humanidade, a sua perfeição. Quando Cristo diz a seus discípulos: “
Sede, portanto, perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito”
[5], Jesus está querendo dizer que devemos buscar configurar-nos à sua Imagem e Semelhança pela qual Ele criou o homem. E assim, vemos que o chamado de Deus para a humanidade é realizar uma perfeição originária, um chamado a recobrar aquilo que foi perdido pela desobediência dos primeiros pais (Adão e Eva). Esse é o chamado à Santidade, que já na antiguidade Deus já faz ao ser humano: “Sede Santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou Santo”
[6]. Em Maria tudo é ordenado, equilibrado, tudo tende ao bem. Em Maria se realiza a plenitude antropológica. Ela é a perfeita imagem de Jesus Cristo.
Sendo Maria preservada do pecado original, a perfeição de santidade lhe permitia vencer o pecado de modo universal. “
A ausência completa de pecado compreende a isenção de todos os movimentos naturais involuntários da concupiscência desregrada, dos pecados materiais ou inclinações para o pecado e de todos os atos inteira ou parcialmente voluntários que constituem pecados formais, próprios ou pessoais”
[7]. Assim, vê-se que em Maria temos como que um arquétipo, um modelo original, uma perfeita expressão daquilo que Adão e Eva possuíam e eram antes do pecado. Em Maria está a perfeição do ser humano desejado por Deus na criação. Por isso, o Arcanjo Gabriel a saúda dizendo: “Alegra-te, cheia de Graça! O Senhor está contigo”
[8]. O Arcanjo na saudação manifesta essa pura perfeição, reconhecendo-a cheia da graça santificante, graça que a preservou do pecado, e reconhecendo também que o Senhor estava com ela. É uma alusão à experiência de Adão e Eva no paraíso, onde, perfeitos e inclinados somente ao bem, estavam na presença do Senhor – caminhava com Ele no Jardim
[9]. Maria, por ter sido preservada do pecado e por possuir a perfeição criacional, viveu na terra como se nunca tivesse saído do paraíso, permanecendo na presença de Deus.
O Senhor estava com ela.
Maria é a perfeita criatura, aquela que dentre toda humanidade expressa a imagem e semelhança de Deus, aquela que encerra em si a plenitude da perfeição que o próprio Deus quis para o ser
humano.
Na criação Deus criou Adão e Eva perfeitos, “foram constituídos em um estado de santidade e de justiça original; esta graça da santidade original era uma participação da vida divina”
[10], e essa perfeição se refletia e se expressava de algumas formas; em primeiro lugar, pelos dons preternaturais (Imortalidade, Domínio das Paixões e Ciência Infusa). Esses dons eram possibilitados pelo estado de pureza e perfeição em que foram criados. “Pela irradiação desta graça original, todas as dimensões da vida do homem eram fortalecidas. Enquanto permanecesse na intimidade divina, o homem não devia nem morrer, nem sofrer.”
[11] Esses dons possibilitavam uma participação na vida plena em Deus, o domínio das paixões interiores e a contemplação da verdade de Deus pelo dom da ciência infusa.
O ser humano também recebe de Deus no paraíso três múnus a serem exercidos. O múnus sacerdotal, que era a capacidade de intimidade com o próprio Deus, de relacionar-se intimamente; vemos que os primeiros pais caminhavam com Deus no jardim do Édem. O múnus Régio, que Deus dá a Adão, ao dar nomes a todas as coisas e governar toda a criação (Gn 2,20). E o múnus Profético se reflete na capacidade que Deus deu a Adão de perceber a verdade das coisas e a verdade de Deus, e transmiti-la às gerações precedentes. Esse múnus profético dá capacidade de corrigir, ensinar e conduzir para a verdade. Assim, vê-se que Maria possui, por essa justiça original, uma harmonia interior, harmonia que possuíam os primeiros pais antes do pecado original. Em Maria tudo é ordenado e equilibrado.
Com isso, Maria é também resposta aos questionamentos existenciais da humanidade, assim como Cristo também é; dessa forma, Maria é digna de ser imitada, pois imitando a ela, estamos imitando a perfeição do próprio Deus, que é expressa em todo seu ser. Assim, Maria se torna um exemplo referencial para um melhor entendimento da antropologia, daquilo que é o fim último para qual todo ser humano foi criado: para a Felicidade pelo o bom uso da liberdade.
2 – Fontes Mariológicas
Para uma melhor compreensão da figura de Maria na história da salvação, precisamos ter em vista algumas fontes de pesquisa. Essas fontes nos possibilitam perceber a essência e o lugar devido de Maria na vida de Cristo, da Igreja e na obra de salvação.
Em todo desenvolvimento desse trabalho usaremos essas fontes, que nos esclarecerão e nos farão melhor compreendê-lo e embasá-lo. As fontes a serem usadas são: a fonte Bíblica, o Sensus Fidelium, a Tradição, o Magistério, a Teológica e a Espiritual. Cada fonte possui o seu desenvolvimento próprio, mas sempre em consonância uma com as outras. Elas não se contradizem, mas se completam.
A fonte Bíblica
[12] é a principal, a mais importante e o critério último, mas lida sempre dentro da grande Tradição. A fonte bíblica nos possibilita perceber a consonância do mistério Mariano com o mistério de Cristo. Também nos possibilita perceber a importância da figura de Maria na história da salvação, em conformidade com a obra salvífica de Deus em Cristo. A fonte bíblica coloca Maria como parte também da revelação divina. Assim, é de extrema importância ter um olhar especial para os textos da Sagrada Escritura que colocam Maria como figura ativa, mesmo que ela tenha um papel de cooperação ao lado daquele que é o autor da Salvação.
A fonte do Sensus Fidelium
[13] é aquela que é a manifestação popular, expressa por devoções e piedades marianas do povo de Deus. O senso de fé da Igreja, desde as origens, é um dado de grande relevância, pois nos possibilita uma verdadeira percepção daquilo que era a fé dos primeiros cristãos para com a figura de Maria; desde as origens do Cristianismo até os dias de hoje. Esse senso de fé popular reflete o puro afeto, respeito e veneração pela figura de Maria, como a mãe do Salvador. Essa fonte nasce com a capacidade do povo de Deus em perceber a importância de Maria para com a
Obra de Salvação.
A fonte da Tradição
[14] nos dá uma contemplação de um desenvolvimento teológico e Litúrgico. Possibilita-nos contemplar em autores, principalmente da Patrística, uma gama de desenvolvimentos teológicos e espirituais, que muitas vezes se davam por sermões e homilias. Conhecimentos eram transmitidos de pessoas para pessoas, pregadores para pregadores, até que se chegasse a uma unidade de fé com os dados transmitidos. Muitos elementos da tradição chegaram até nós pela liturgia, pois sempre na Igreja se teve a consciência de que se reza e se celebra aquilo que se crê, e se crê naquilo que se celebra e se reza. Muitas coisas chegaram até nós, não pela escritura, mas sim pela tradição, pela experiência existencial e temporal de uma comunidade que transformou em vida aquilo em que acreditava.
A fonte do
Magistério[15] é aquela que chega até nós pelos Concílios, pelos documentos magisteriais, e pelo ensino dos Bispos em comunhão com o Santo Padre o Papa. Pelo Magistério nos chega o desenvolvimento teológico mais sistemático, a proclamação de Dogmas de fé, a regulamentação e aprovação de expressões litúrgicas e devocionais. Ter em vista os documentos do Magistério da Igreja é importante, pois temos a oportunidade de acompanhar o pensamento e desenvolvimento histórico das grandes questões da fé, que foram sendo definidas e no decorrer da história pelos Concílios e suas constituições dogmáticas.
A fonte Teológica é a que chega até nós pela reflexão crítica e sistemática dos Doutores da Igreja e dos teólogos em consonância com a fé da Igreja. Essa fonte nos advém pelos estudiosos que se dedicam à sistematização do dado de fé, para uma melhor compreensão e vivência do mistério na vida da Igreja. “Graças à assistência do Espírito Santo, a compreensão tanto das realidades como das palavras do depósito da fé pode crescer na vida da Igreja: pela contemplação e estudo dos que creem, os quais as meditam em seu coração; e em especial pela pesquisa teológica, que aprofunda o conhecimento da verdade revelada
[16].
No desenvolvimento teológico, a reflexão acontece de formas direta e indireta. A forma direta é aquela em que se chega a um resultado pelo dado revelado explícito, como por exemplo: “Sabemos que Maria é mãe de Jesus pelo dado revelado”. A forma indireta se dá pela conclusão a partir do desenvolvimento lógico do dado revelado, aquilo que está implícito nas passagens, dados que são importantes para salvaguardar o dogma de fé. Como por exemplo: “Assim como pelo dado revelado sabemos que Maria é a mãe de Jesus, de forma indireta podemos dizer que Maria é mãe de Deus, uma vez que, se negarmos a divindade de Jesus, estaremos negando um dado de Fé”.
A fonte da Espiritualidade
[17] é aquela que nos chega principalmente por meio de autores que perceberam uma via de relação para com Deus, viveram e conduziram almas nessa mesma via. Esses autores deixaram muitas obras de espiritualidade que alimentam a fé e a devoção do povo de Deus. Essa fonte também é segura quando aprovada pela Igreja. As obras de Espiritualidade são grandes vias que nos possibilitam uma relação mais íntima com Deus.
3 – Síntese da fé Cristã
Em Maria expressa-se a síntese da fé Cristã, pois nela se realiza a plena confiança na profecia dos antigos, na promessa de Deus aos homens, de enviar o Messias para a salvação do povo eleito. É ela também que recebe a Boa Nova pelas palavras do Arcanjo Gabriel. Ela é a primeira que acreditou e confiou na obra de Deus, quando disse o seu “fiat”
[18]. Ela foi a primeira que anunciou a Boa Nova, o Salvador, quando visita a sua prima Isabel
[19]. Assim, vemos que Maria é a primeira criatura que teve um encontro pessoal com Jesus, a primeira que confiou na obra salvífica de Deus e a primeira que anunciou a Boa Nova da salvação ao mundo.
Em Maria também encontramos a essência do dogma cristológico. Afirmando-a “Mãe de Deus”, estamos afirmando a humanidade e divindade de Jesus. Dado da nossa fé que é essencial para a compreensão da salvação universal.
Em Maria também vemos as conexões Trinitárias. Maria, que é Filha de Deus Pai pela fé de Abraão; que é esposa do Espírito Santo pela divinal concepção; e que é Mãe de Deus Filho pela geração do Filho de Deus em seu ventre.
Há uma relação também de Maria com a história da salvação, que vemos pelas prefigurações marianas do Antigo Testamento e as profecias que remetem à vinda do Messias por uma virgem, como em
Isaías 7,14. Depois, vemos a figura de Maria nos momentos importantes da vida de Jesus Cristo.
Por fim, observamos a relação eclesiológica de Maria. Maria é relacionada com a figura da Igreja de forma muito especial, pois assim como Maria dá à luz ao Filho de Deus, a Igreja pelo Sacramento do Batismo dá a vida a novos filhos de Deus. Maria é imagem eclesiológica também pelo seu testemunho de fé, em que é considerada a primeira cristã, portanto, a primeira que se tornou membro ativo do corpo de Cristo que é a Igreja. Chegamos a essa conclusão pelo fato de que nos tornamos Igreja pelo testemunho que damos da verdadeira fé em Cristo.
4 – Dos quatro Privilégios
Quatro privilégios acompanham Maria, privilégios que nenhuma mulher na história recebeu da parte de Deus. Esses privilégios são responsáveis por tornar Maria a “bendita entre todas as mulheres”
[20]. Esses quatro privilégios foram declarados dogmas de fé pela Igreja, e são privilégios que acompanham a ortodoxia da fé sobre a Pessoa de Cristo. São responsáveis por fazer de Maria aquela que é digna de ser amada e venerada, não por aquilo que realizou, mas por aquilo que Deus realizou na vida dela. E, em seguida, pelo exemplo que foi para a Igreja nascente.
Só Maria é a Mãe de Deus, por ter dado à luz o Filho de Deus. Só Maria é mãe virginal, por ter concebido pelo poder do Espírito Santo. Só Maria foi preservada da culpa original, pois era preciso que fosse pura, para que na geração não tornasse impuro o bendito fruto que nasceu do seu ventre. Só Maria foi assunta ao céu, pois aquela que, depois de ter realizado a sua missão aqui na terra, deveria ir para junto de Deus no Céu. Tais privilégios são dados de fé que acompanham a comunidade cristã desde a sua origem, e que ao longo do tempo foram definidos para salvaguardar o depósito da fé deixado por Jesus e a tradição vivida pela Igreja de todos os tempos.
Com isso, vê-se que esses quatro privilégios já são suficientes para tornar Maria uma mulher diferente das outras mulheres, não por uma divindade, mas por uma santidade que o próprio Deus lhe concedeu, uma perfeição original, para trazer aquele que é perfeito ao mundo. É impossível que de uma imperfeição possa nascer uma perfeição, e por isso Maria é preservada desde sempre para gerar aquele que era perfeito. Essas grandes Graças na vida de Maria só exaltam o próprio Deus que nela realizou grandes coisas
[21].
5 – Obra Prima de Deus: “sete joias” – “tota pulchra”
Maria é considerada a grande obra prima de Deus, é chamada Tota Pulchra (“Toda Bela”). Ela é a obra prima porque nela há toda a perfeição do ato criacional de Deus. Todas as coisas foram criadas perfeitas, mas, pela rebeldia do demônio, que por livre vontade quis se afastar de Deus, e perdeu sua perfeição participada em Deus. O demônio, assim, quis perder aqueles que foram criados à imagem e semelhança de Deus. E, com isso, num diálogo malicioso com a Eva, mulher de Adão, fez com que ela comesse o fruto proibido, e oferecesse a Adão. Assim, pela desobediência dos primeiros pais, a imperfeição tocou a humanidade e toda a sua descendência herdou a concupiscência, uma inclinação ao mal, que arrasta a humanidade ao pecado, e faz com que o ser humano desordene as coisas criadas.
Em Maria, preserva-se toda a perfeição da criação, pois ela é a cheia de graça, que não perdeu a graça original. Ela também é dita bendita entre todas as mulheres, pois foi a única entre todas as mulheres que teve a felicidade de trazer o Filho de Deus ao mundo. É dita a Mãe do Senhor, pois foi o que ela foi, a mãe de Jesus, Senhor do Céu e da Terra. É bendita porque acreditou, confiando no grande mistério da promessa de Deus. Também no cântico Magnificat, em que Maria exalta a Deus pelas grandes coisas que Ele realizou, traz uma profecia, de que todas as gerações a proclamariam bem-aventurada. Nós o comprovamos no decorrer da história, pois a nenhuma outra mulher se deu um louvor ininterrupto até os dias de hoje, somente a Mãe de Deus. Só em Maria, também, se realizou a onipotência de Deus que a preservou da culpa original, e que a fez dar à luz pela força do Espírito Santo o Filho de Deus. Também o termo Mulher, que por algumas vezes é usado em relação a Maria, é um termo que não deprecia a figura da mãe de Jesus, mas é um termo que faz íntima relação com Eva. Eva, a mulher que perde a sua santidade e perfeição pela desobediência, perde a plenitude do ser mulher. Em contrapartida, Maria é mulher no sentido mais profundo da palavra, é aquela que realiza em si a plenitude do ser mulher. Maria é dita a Nova Eva, a mãe da nova criação.
6 – Maria no Mistério de Cristo
Maria está em íntima relação com os mistérios de Cristo, presente nos momentos cruciais, tanto nas prefigurações do Antigo Testamento, quanto na vida do Verbo Encarnado. Maria está presente principalmente naqueles mistérios da vida de Cristo que se referem à vida e vocação universal de cada cristão. Em alguns mistérios essenciais da vida de Cristo, ela não está presente, não porque esses são menos importantes, mas porque são reservados a vocações específicas, como, por exemplo, na instituição da Eucaristia e do Sacerdócio que Cristo confere aos Apóstolos
[22].
Por isso, é importante perceber a vontade de Deus, que quis que Maria estivesse unida ao mistério do Verbo Encarnado. E é indiscutível essa presença. Por esse motivo, ela é dita a Mãe e Educadora, e também nela se realiza a verdadeira figura do Discípulo Missionário de Jesus Cristo: “A máxima realização da existência cristã como um viver trinitário de ‘filhos no Filho’ nos é dada na Virgem Maria que, por meio de sua fé (cf. Lc 1,45) e obediência à vontade de Deus (cf. Lc 1,38), assim como por sua constante meditação da Palavra e das ações de Jesus (cf. Lc 2,19.51), é a discípula mais perfeita do Senhor. Interlocutora do Pai em seu projeto de enviar seu Verbo ao mundo para a salvação humana, com sua fé, Maria chega a ser o primeiro membro da comunidade dos crentes em Cristo, e também se faz colaboradora no renascimento espiritual dos discípulos”
[23].
Portanto, há uma grande consonância entre a pessoa de Maria e a vida de Jesus Cristo. Maria participa do mistério de Cristo, mas também é reflexo perfeito do mistério da humanidade, em que ela, assim como seu filho, que é verdadeiro Homem, é também verdadeira Mulher no sentido mais profundo da palavra. A figura de Maria é propriamente o grande mistério de Cristo. Preparada por Ele, Vivendo com Ele e Permanecendo nEle de corpo e alma no Céu. Maria está no mistério de Cristo e da Igreja.
7 – Tudo em Maria nos leva a Jesus
Em Maria há uma justiça original. Ela seria incapaz, pela natureza, de reter algo para si que não seja dela. Por mais que alguém dê uma honra, um louvor, ou até um ato de adoração, ela não reteria para si, mas entregaria tudo ao seu filho. Por isso, a importância da verdadeira devoção, de aprendermos a dar com justiça aquilo que é devido a cada um.
A verdadeira devoção a Virgem Maria nos inclina cada vez mais à adoração de Jesus, principalmente no Santíssimo Sacramento. Como essa devoção nos faz perceber o devido culto que devemos a Maria, percebemos e aprendemos também qual é o verdadeiro culto que devemos dar a Deus e aos Santos. Assim, essa devoção nos inclina mais ainda a Amar e Adorar Jesus como Ele merece.
Tudo em Maria nos leva a Jesus. Por Maria nós contemplamos o grande Mistério da Encarnação do Verbo, que é Jesus. Em Maria se cumpre a profecia dos antigos que prometiam e anunciavam a vinda de Cristo. Também em Maria somos conduzidos a uma vivência mais plena da unidade da Igreja que é o Corpo Místico de Cristo. Todo louvor, respeito e veneração que damos a Maria é um ato de louvor, respeito e veneração que damos a Deus, por tudo aquilo que Ele realizou em Maria.
A prova real de uma verdadeira devoção a Maria é o desejo de Conhecer, Amar e Adorar a Jesus. Essa é a maturidade que a devoção a Nossa Senhora gera em nossa alma um desejo sempre maior de estar na presença de Jesus.