Annecy, primeira sexta-feira de abril de 1894.
Joseph Tissot, Missionário de São Francisco de Sales
É ao mesmo tempo uma honra mas também um tormento para o homem decaído que jamais consiga se habituar às suas faltas. Príncipe destronado, desclassificado pelo pecado dos seus primeiros pais, ele conserva, apesar disso, no mais fundo do coração, o sentimento da sua nobreza de origem e da inocência que deveria caracterizá-lo. Cada vez que cai, reprime com esforço uma exclamação de surpresa, como se lhe tivesse acontecido um acidente extraordinário; assim como Sansão, quando privado da sua força pela mão traiçoeira que lhe cortou os cabelos.
Levanta-te!, gritavam-lhe,
Os filisteus estão aí! E ele levantava-se, imaginando que, como antes, encheria de terror os seus inimigos, mas sem lembrar-se que o vigor de outrora o havia abandonado. (Jz 16,20)
Por mais nobres que sejam em nós as raízes desta disposição, os seus frutos são funestos demais para não os detestarmos. Como veremos em breve, o desânimo leva as almas à perdição, mas podemos estar certos de que esse sentimento só nos invadirá se lhe abrirmos as portas pelo espanto que se segue à queda. Contra este grande perigo é que São Francisco de Sales, nas páginas que se seguem, vai nos acautelar.
A exemplo dos grandes Doutores da Igreja e dos sábios mais lúcidos, o bem-aventurado Bispo de Genebra, São Francisco de Sales, manifestou sempre extrema compaixão pela fraqueza do homem. Dizia: “Ó, miséria humana, miséria humana! Como estamos rodeados de fraquezas! Que podemos esperar de nós mesmos senão quedas contínuas?”
[2].
Sente-se, em todas as suas palavras e escritos, que o grau de perfeição a que se tinha elevado lhe dera a capacidade de mergulhar um olhar profundo no abismo de misérias e fraquezas cavado em nós pelo pecado original. Tinha-o muito presente ao orientar espiritualmente as pessoas que se confiavam à sua direção, e não cansava de recordar-lhes a fragilidade da condição humana decaída: “Viveis, escrevia ele a uma senhora, com mil imperfeições, conforme me dizeis. É verdade, minha boa irmã; mas não vos esforçais a todo momento por fazê-las morrer? Podemos estar certos de que, enquanto andarmos neste mundo, envolvidos neste corpo tão pesado e corruptível, sempre haverá em nós um não sei quê que falhará”
[3].
“Queixai-vos, dizia em outra ocasião, de em vossa vida terdes muitas imperfeições e defeitos, apesar do vosso desejo de perfeição e de pureza no amor de nosso Deus. Respondo-vos que não é possível desprendermo-nos completamente de nós mesmos enquanto vivemos aqui em baixo. É necessário que nos suportemos sempre a nós próprios, até que Deus nos leve ao Céu; enquanto isso, convençamo-nos de que não transportamos nada de muita importância...”
[4]. “Pois é uma regra geral que ninguém será tão santo nesta vida que não esteja sujeito a cometer imperfeições”
[5].